2004-10-22

Perfume de mulher

Curioso como certas situações, por mais triviais ou diminutas, cotidianas ou singelas, provocam-nos.

Quinta-feira (2004-10-14) fui ao barbeiro para "ter meu cabelo cortado" (pequeno lembrete do uso causativo de 'ter'). Fui não uma, mas duas vezes, pois na primeira encontrava-se ele já em horário de almoço. Na segunda, logrei êxito.

Mas gostaria de concentrar este breve relato na volta da primeira vez, quando, vencendo um pequeno aclive, cruza-me o caminho uma desconhecida. Ela descendo, nada haveria digno de nota, não fosse o que pude perceber um ou dois instantes logo após sua passagem.

Quem me conhece sabe que pouco (ou nulo) uso faço de adereços. Mesmo meu relógio de pulso (que uso como cronômetro), comprado em dezembro passado, até hoje não fez jus ao nome, entrelaçado em meus dedos que deixo -- daí minha opção por um relógio de bolso, para as verificações horárias cotidianas. Tampouco de odores me tinjo, temente que sou das impressões errôneas que se possam expressar -- na verdade, nem tanto, mas isso já são outros quinhentos.

Após aqueles poucos segundos, pensei em tornar e perguntar-lhe o nome e onde o encontrara -- talvez pensasse eu em presenteá-lo, um dia. Mas ela já se encontrava distante. Uma pena idéias assim ocorrerem-me com retarde. Ou não. Se uso não faço dessa sorte de artifícios -- conquanto não o reprove em outrem --, careceria de coerência agir em desacordo com meus próprios preceitos. Por que, então, por um átimo almejar algo por mim mesmo tido como tão externo, supérfluo até?

Talvez, quem sabe, esteja eu cedendo às pressões do que me rodeia e que minha fortaleza mina. Talvez, quem sabe, não haja assim tanto mal nessa ação por tantos praticada. Talvez, quem sabe...


Nota: Título remetente ao filme Perfume de mulher (Scent of a woman, EUA, 1992).

(da série Mens Sana)